O que você vai ser quando crescer?

Quanto estamos para ter um filho é comum que façamos projeções sobre este ser futuro. É a idealização da criança. Projetamos muitos pendores no rebento não raramente de forma exagerada, de um filho perfeito, dentro da nossa limitada e vulnerável versão de perfeição…

Humano que sou, com as limitações inerentes a esta qualidade essencial, fiz algumas quando você estava para nascer. Não cheguei às raias da loucura, mas fiz meus prognósticos. Queria um filhotinho alegre e risonho. Com a cara meio safada de quem gosta de arte. Um neném brincalhão e bem humorado. Imaginei um menino bonito, de jogar bola e fazer turminha. Previ um filho carinhoso, que gostasse de se aconchegar em meio peito, só para ficar ali vivendo a vida que se vive juntinho. Pensei como seria bom, sim seria muito bom, ter um filho que tivesse o mesmo time que eu e que compartilhássemos as vitórias a as derrotas, como metáfora da vida. Às vezes se ganha, às vezes não, mas não se deixa de jogar com alegria. Programei que você fosse um jovem bem sucedido, que estudasse, jogasse, se relacionasse, amasse, tudo, tudo, tudo muito bem.

Confesso que fui assim desabusadamente projetando você. Como se eu fosse o próprio Criador, que pretensão! Mal sabia eu, filhinho, que Ele, em sua infinita paciência, não tomaria a minha tola aspiração não como um pecado, mas como uma prece. E assim foi. Pela mercê de Deus, você foi se tornando tudo isso e muito mais. Não só foi o bebê fofo, o safado que roubava a chupeta da sua irmã, o pequeno que se aninhava em meu colo após das várias risadinhas gostosas e escondia seu rostinho no meu peito, menino de bola e de pique, menino vasquinho da gama de berço e de glória, chova ou faça sol, adolescente falante sobre os problemas do Brasil e do mundo, vivo e interado da vida em si, desportista estudantil bem sucedido, reconhecidamente inteligente e bem desempenhado nas letras acadêmicas. Ah, os sonhos limitados e abobados dos pais! Você foi muito mais que isso!

O que eu pedi, ao projetar todas as coisas imaginativas que pude, foi muito menos do que Deus me deu. Com efeito, além destas coisinhas mundanas de ser bonito, de ter sucesso, de conseguir isso ou aquilo, você me saiu melhor que a encomenda. Se tornou por si próprio uma pessoa ética. Integralmente ética. No discurso e na prática. Ama o que é certo e rejeita aos safanões, às vezes um tanto exagerados, aquilo que é errado. Tem uma indignação genuína com o que considerada desonesto, se irrita com a burrice, com o egoísmo, com a passividade.

Perceber esta sua indignação com o lugar-comum, com as mentiras deslavadas que de tantas vezes contadas começam ser aceitas como verdade, me emociona. Você não se fez refém nem da demagogia, nem da indiferença. Pois se os pais soubessem o que há para além das medalhas, dos diplomas e outras consolidações do orgulho, poderiam pedir melhor. Se eu pudesse voltar atrás e pedir de novo o que projetei quando te esperava, meu amado, pediria que você fosse assim, como é, um caráter melhor que o meu, dono de uma força interna brutal e contagiante, capaz de botar abaixo aquilo que não deve mesmo ficar de pé. Não o fiz porque, naquelas alturas da minha juventude, ainda não havia entendido que Deus faz pela gente mais do que ela efetivamente merece. Mas agora percebo isso, por você. Feliz aniversário. A lei diz que você agora pode fazer tudo sem mim. Mas estarei aqui sempre, para o que der e vier. Te amo.

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